ARTICULANDO O URBANO DIVIDIDO Entre a última década do Séc. XX e a primeira do XXI, muita coisa aconteceu nesta cidade, e a perspectiva, hoje, é que continue a acontecer. A minha atuação profissional, primeiro na cidade formal e depois na informal, permitiu-me “descortinar” horizontes inesperados nos campos teórico e prático. Um novo campo de ação, a cidade informal, se revelou pouco a pouco um espaço de pensamento e reflexão, de vigor inusitado. Uma nova área de atuação para o arquiteto, que já tinha sido intuída por Joaquim Ferreira dos Santos e artisticamente interpretada por Hélio Oticica, direção na qual eu me incluo. Os projetos, a reflexão teórica cada vez mais intensa, os prêmios e distinções internacionais e a escala crescente dos problemas abordados, abriram um panorama de temas e questões contemporâneas relevantes, em termos sociais e urbanísticos, configurando uma inserção cada vez maior no debate internacional relativo às grandes metrópoles do planeta. O fato do Rio de Janeiro estar no centro das atenções nacionais, com grande visibilidade internacional e às vésperas de novas e profundas transformações sócio-espaciais, representa um enorme desafio para todos nós. É importante lembrar que o Rio é cidade cabeceira de um dos BRICs, junto com Mumbai, Beijin e St. Petersburgo. As interseções entre diferentes disciplinas representam uma das formas necessárias para o entendimento destas transformações. A outra é a própria prática profissional entendida como instrumento socialmente útil, o arquiteto como “prestador de serviços” para a formulação de objetivos ambiciosos, em relação com as questões físicas (a articulação da cidade, da urbanidade e do espaço público), as questões sociais (econômicas, culturais e existenciais) e ecológicas (ecologia mental, social, emocional e ambiental), no seu cruzamento com as questões do sujeito contemporâneo. Uma exposição “retroprospectiva” é a ocasião para a revisão do já feito e do quanto, ainda, falta por realizar. É uma plataforma e ao mesmo tempo um estímulo para continuar a “fazer o que deve ser feito”. O que implica uma questão ética. O que deve ser feito exige responsabilidade. Não se trata de fazer de qualquer maneira, nem, menos ainda, de uma questão relativa ao “sucesso profissional”. È uma questão que demanda permanentemente se indagar sobre a difícil tentativa de fazer confluir o individual e o coletivo, o público e o privado, o que é de interesse comum, e o que é de interesse de setores específicos da sociedade. A cidade dividida entre “integrados” e excluídos dos benefícios da urbanidade, é um dos sintomas muito claros do atual “mal-estar na cultura” de que falava Freud, e que nos atinge diretamente. Como desenvolver uma prática que tenha por consequência a produção de projetos que contribuam para articular diferenças, para criar lugares de interseção entre realidades muitas vezes antagônicas; projetos capazes de funcionar como referência consistente para a negociação dos conflitos? Jorge Mario Jáuregui
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