... enfrentar cada desafio projetual como se de um experimento se tratasse e não apenas como uma forma de manter uma estrutura produtiva. A questão é, sempre, encontrar o potencial fenomênico da ideia. É sobretudo uma forma de ver e de fazer parte do mundo. E a minha forma de fazê-lo, como tem sido observado, é às vezes com um pé dentro e outro fora, às vezes com os dois dentro e às vezes com os dois fora. Isto tem a ver com ética, estética e política. Quer dizer, com princípios (o ético) com desafios (o desafio do novo) e com ação (as relações sempre complexas com as estruturas de poder).
O vínculo entre fazer (projetos) e pensar (costurar relações entre ideias, coisas e acontecimentos) implica sempre uma relação tensa. Não se pensa senão às marteladas nos dizem os filósofos, e nós "arquitetosurbanistas" sabemos que não se projeta se não ao custo de não ceder do desejo, isto é, às vezes indo mesmo contra o que nos é solicitado.
De acordo com a psicanálise, o imperativo ético implica "fazer o que deve ser feito", e sabemos que nesse sentido a responsabilidade pelos nossos atos é de fundamental relevância. Ao mesmo tempo, a interpretação da demanda, não só manifesta senão fundamentalmente a que se encontra em latência, encoberta, só no desenvolvimento do diálogo arquiteto-"cliente" pode ser trabalhada, para depois ser sintetizada formal e espacialmente. O pequeno, o médio, o grande, o territorial; o público e o privado; o individual e o coletivo, são instancias ineludíveis do acionar de um arquiteto no espaço urbano.
Desde o inicio das minhas atividades profissionais tenho defendido (e procurado ser coerente com isso) uma articulação entre prática projetual e a prática teórica, entendidas ambas como partes necessárias e entrelaçadas do trabalho de produção, reflexão e inserção no debate da arquitetura, o urbanismo e da paisagem contemporâneos, buscando interpretar o "espírito do tempo", com sentido de lugar. É por esta razão que cada projeto deve estar referido a uma proposta teórica global, constituindo-se num aspecto essencial do método de trabalho que não se pode realizar senão através da investigação sobre cada lugar específico de atuação, como forma de superar o enfoque funcionalista que reduz a complexidade e a multidimensionalidade da arquitetura à unidimensionalidade da função.
Em cada projeto, em cada intervenção, seja de caráter urbanístico, arquitetônico ou paisagístico, a estrutura conceitual é sempre diversa, dependendo das características do lugar, do programa, da interpretação das demandas e dos condicionantes circunstanciais.
Projetar implica, desde esta perspectiva, combinar argumentos pragmáticos com percepções subjetivas. Assim, ao estudar um tema não surge necessariamente uma ideia única, senão um conjunto de ideias que vão formar a espinha dorsal de um projeto, e o significado do trabalho emerge quando se encontra o modo de interconectar todas as variáveis que intervêm, interpretando formal e espacialmente as forças e as circunstancias que atuam no lugar.
É na relação entre lógicas heterogêneas que devemos operar uma interseção capaz de permitir a coexistência entre termos que, em princípio, não poderiam coexistir. Isto implica um tipo de operações de coesão capazes de possibilitar "compor em situação" termos de lógicas aparentemente incompatíveis. Trata-se sempre da conexão entre fatores em tensão, buscando articular o espaço dos fluxos com o espaço dos lugares, favorecendo novos "encontros" e "alianças" se movimentando entre produção estética e transformações sócio-espaciais.
Assim, praticar a arquitetura e o urbanismo implica tecer uma densa rede de relações que amarram o imaginário à construção do mundo real.
É sempre uma questão de re-imaginar as relações entre a nossa subjetividade, e o mundo.
Como toda representação, contém uma parte visível, e outra, invisível...
GENEALOGIA
Latino-americanidade: estado de espírito que orienta as ações,fundado no patrimônio cultural compartilhado derivado das culturas pre-colombianas na sua fusão com a matriz ibérica e africana, caracterizado pelo processo de absorções, contaminações e transformações específico da arquitetura e do urbanismo do nosso continente.
Revista Harper's Bazaar Brasil - Setembro 2014
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