Punto de Vista
Atos de hesitação - os croquis de investigação do arquiteto Jorge Mário Jáuregui

Para que sirve un diagrama para un arquitecto? Un diagrama es, en la perspectiva que nos interesa, la huella de lo que existe, pero ya encaminándose para lo que puede venir a existir. Incluye entonces para un "arquitectourbanista" una tensión entre lo real (inaprensible) y la potencia lógica ordenadora de que habla Lacan. Potencia lógica ésta, que presupone una pulsión estética. Hay, por esta razón, desde el inicio, una cierta intención ordenadora que organiza estéticamente, que tiende hacia "lo bello", signifique esto lo que signifique.

A necessidade em desvelar “espaços”– como uma gênese - revertendo categorias de representação idealizadas de uma prática urbanística, traz à cena os diagramas que conduzem o arquiteto Jorge Mário Jáuregui em investigações de uma arquitetura de sentidos.

Desconstruir a opacidade de uma arquitetura mediadora – de propriedades, quantidades, distâncias, mensurações – que racionalmente e progressivamente impõe sentido a lugares, designa nomes, detem leis de ordem - compõe a feitura dos diagramas, de que faz uso o arquiteto Jorge Mário Jáuregui, para a (des)construção da articulação sócio – espacial, interagindo a produção de espaços com cotidianidade.

Cotidianidade ancorada na subjetividade, que interliga espaços-tempos, da permuta entre corpos, textos, lembranças, visões onde em relances - hesitações - fazem emergir potencialidades possíveis de situações, como nos remeteria o filósofo Merleau Ponty, de momentos silenciosos, quase gestos que anunciam palavras , dá o sentido ao que Jáuregui diz brindar a possibilidade de se abrir o visível para o campo de articulações .

Hesitações deixando vir à tona palavras que anunciam atos expressaria a potência da mão, a que diz o arquiteto ser imanente a um estado de prazer imerso em abstrações . E não seriam, estas abstrações as sombras que emanavam da luz que viria tensionar as divergências entre pintura e espaço renascentista no barroco dos contrastes entre espiritualidade e racionalismo?

O pintor renascentista Leon Battista Alberti, em seu tratado “Da Pintura”, ao discernir que reside no pintor o modo que pode seguir com a mão o que compreendeu com a inteligência vem celebrar o ato da imanência de um espaço que está por vir. E não seriam estas as mãos vazias, diz o arquiteto Jauregui, à espera da vazão de impulsos conduzidos por advertências vindas dos pensamentos, como nos aponta o filósofo Merlau Ponty, anunciadores da possível interação entre signos formuladores de linguagens? Alberti ao dizer que o arquiteto “tomou do pintor as arquitraves, as bases, os capitéis, as colunas, as fachadas e outras coisas (...)” e ainda ao afirmar que “talvez não se encontre arte de algum valor que não tenha vínculos com a pintura, de tal forma que se pode dizer que toda beleza que se encontra nas coisas nasceu da pintura” vem reforçar a condição do desenho como mero instrumento a mediar a forma dos contornos, das sombras implícitas na natureza.

O diagrama, ao mediar uma apreensão do mundo, semelhante ao processo de uma pintura que vem representar o que vê “sentindo”, neste caso, revelaria traços como impressões de um mundo e impulsionaria posteriormente o desenho das ideias. Esta pintura albertininana que não distingue beleza, realidade e representação, parece embebida na tensão a que o arquiteto Jauregui deixatransparecer na tendência de a arquitetura vir sublimar a potência - do belo, do vivo - em uma estética ordenadora.

A apreensão de signos, nascidos da prática que Jáuregui empreende em seus diagramas, torna-se um campo de percepção da forma que se instaura prévia à intenção do arquiteto em ordenar e organizar plasticamente o espaço segundo uma lógica orgânica – funcional e estrutural. Intenção plástica, na condição de ser uma arquiescrita experimental, que tem carga e é desenho como no risco costiniano revelando determinada intenção , rege o traçado como sendo um signo, que atua entre o sentido e a razão, na difícil conversação da relação do sujeito no ciclo contínuo de desvelamentos, que desafiam a lógica. Veja a persistência da ambiguidade barroca!

Jauregui parece ter persistido nas hesitações do pintor Leon Battista Alberti quanto ao espaço renascentista, antevendo as imperfectibilidades do desenho literalmente à sombra do espaço barroco.

Personificando o papel de pintor / arquiteto descontrói a representação universal contida na ponderação de que “a cultura nunca nos oferece significações absolutamente transparentes, a genes do sentido nunca está terminada” e faz colidir racionalidade e subjetividade em pinturas / diagramas dos fenômenos humanos.

 Diagrama como sentido de interação entre arte e arquitetura

Las favelas constituyen especies de organismos vivos, con voluntad propia, donde acaso y necesidad se imbrican sin fin, exigiendo para descifrarlas, un acercamiento desde varios “frentes” simultáneamente, a ser hecho “ en camadas “. Envuelve el desafío del tamaño y la domesticación de la escala.

A arte contemporânea tem contribuído enormemente para questionar as possibilidades de apropriações com o espaço público. Leituras de obras site specifics desvelando espaços insurgentes de mapeamentos “que se assemelham a uma rede que vai ligando pontos e formalizando um conjunto de relações” fazendo aparecer “elementos justapostos, contrapostos, implícitos uns pelos outros”, formalizam uma determinada configuração estruturalista contida em um lugar, a que Foucault nomeia de heterotopologia .

“Arquitectura es una forma de arte que exige el entrelazamiento de lo visual, de lo conceptual, de lo sensorial, de lo accidental y de lo social, buscando establecer pequeñas parcelas de orden en un contexto infinitamente desordenado.

Os diagramas de Jáuregui, na condição de heterotopologias, inscrevem uma “sequência fragmentária de eventos e narrativas” da interação entre “vivências”, do arquiteto e da comunidade, com o local da implantação futura dos projetos de urbanização. Este processo como vetor dissidente da prática urbana dissecada por Kevin Lynch, no livro A Imagem da Cidade, de 1960, composto pelo mapeamento da percepção de elementos estruturadores de imagens das cidades agrupados em cinco grandes tipos - caminhos, limites, bairros, pontos nodais e marcos – , permeia a configuração de lugares que não difere muito do pensamento do artista americano Robert Smithson, um dos principais precursores do site specific. O seu trabalho “engendrado em desmistificar a distinção entre teoria e prática das maneiras de abordar as experiências estéticas como dimensões do espaço do tempo evidencia uma relação dialógica entre pensamento, obra e lugar” que torna-se parte do lugar e reestrutura sua organização tanto conceitual quanto perceptualmente .

Este procedimento em Jáuregui tornou-se meio para processar o “espaço percebido” - mediado pela simultaneidade do “caminhar olhando” - , contando histórias e revelando tramas, intrínseco às investigações que o arquiteto relativiza não poder se furtar para potencializar o espaço de suas propensões naturais em relação à comunidade. Nesta ordem, Jáuregui expõe à cidade o enfrentamento de seus traumas e afirma ser plausível “uma nova conexão da estrutura urbana como um todo possibilitando articular diferenças quando estas se tornam intoleráveis.” O conflito é uma agenda positiva de trabalho e a favela é o lugar do puro devir! E potencializar o uso de um espaço pela interação entre o formal e informal, à deriva de ressignificações, traduz a “integração arte arquitetura” movida por estado de ambiguidade que o arquiteto vê configurada como uma “estética que une fragmentos”.

A participação do arquiteto na 12ª Documenta de Kassel de 2007, intitulada “The Migration of Forms”, vem evidenciar o significado envolto nas articulações da integração arte e arquitetura, que compõem a relação das experiências estéticas como dimensões espaços/tempos que rompem a formalidade do desenho inerte aos diagramas de Jáuregui.

A temática da 12ª Documenta de Kassel, consistia em discussões sobre a transfiguração das formas da produção da cultura visual e da história da humanidade em outras formas a contento de uma relocação em outros contextos e em diferentes propósitos enlevados pela história da arte. A curadoria, ao apontar que na contemporaneidade estaria implícito um processo de releitura que promove o surgimento de situações inesperadas, enveredando em novas relações entre obras de diferentes períodos da história, revelaria interseções e semelhanças conteudísticas, que predispõem a migração estética de formas através de tempos e fronteiras culturais .

Para o arquiteto Jáuregui projetar sempre implicou nesta perspectiva. Afinal a combinação entre temas e percepções subjetivas seria o componente principal da espinha dorsal de um projeto que conta com a interdisciplinaridade de elementos da urbis que compõem, a cada momento, situações adversas que permeiam formalmente experiências que fundem racionalidade e subjetividade, intrínsecas às práticas cotidianas.

“Proyectar implica, desde esta perspectiva, combinar argumentos pragmáticos con percepciones subjetivas. Así al estudiar un tema no surge necesariamente una idea única sino un conjunto de ideas que van a formar la espina dorsal de un proyecto, y el significado del trabajo aparece cuando se encuentra la manera de inter-conectar todas las variables que intervienen en cada caso, interpretando formal y espacialmente las fuerzas que actúan en el lugar.”

Seria esta arquitetura de Jáuregui a Arte Ambiental de Hélio Oiticica, a que o artista conceitua como um conjunto sensorial ordenado segundo uma 'hierarquia de ordens' - todas dirigidas para a criação de um mundo ambiental ? Os diagramas enquanto articulações entre expressões orgânicas e formas na ordem de estabelecer relações entre arte, arquitetura e história reservariam, no mínimo, correspondências com os pressupostos de Alberti dotando o mundo real da predisposição de vir ser expressão de sua espacialização. E como deixa registrado o pintor renascentista, “durante a pintura devemos estar abertos a todos os que vêm e ouvir a cada um” .

Valéria Veras,


Valéria Veras arquiteta urbanista, desenvolve projetos de curadoria, expografia e arte educação.
Aprofundamento em História da Arte Brasileira pela Fundação Joaquim Nabuco / FUNDAJ e em Curadoria na Escola de Artes Visuais Parque Lage, Rio de Janeiro. Mestranda em Arquitetura PUC- Rio de Janeiro.
Referências Bibliográficas
ALBERTI, Leon Battista. Da Pintura. São Paulo: Editora Unicamp, 2014.
COSTA, Maria Elisa. Com a palavra Lucio Costa. Rio de Janeiro: Editora Aeroplano, 2001.
JÁUREGUI, Jorge Mário. Estratégias de Articulación Urbana. Buenos Aires: Nobuko, 2012.
LYNCH, Kevin. A Imagem da Cidade.
PONTY, Maurice Merleau. O Olho e o Espírito. São Paulo: Editora Cosac&Naify, 2004.
Fonte Eletrônica
FOUCAULT, Michel. Outros Espaços. Disponível em: http://www.uesb.br/eventos/pensarcomfoucault/leituras/outros-espacos.pdf in 13/10/2016
KWON, Miwon. Um lugar após o outro. Disponível em: https://vmutante.files.wordpress.com/2014/08/7-kwon-miwon-um-lugar-apc3b3s-o-outro-em-portuguesartigo-imprimir.pdf in 13/10/2016
PEDROSA, Mário in O Programa ambiental de Hélio Oiticica: por uma geografia da arte. Disponível em: http://au.pini.com.br/arquitetura-urbanismo/121/artigo23405-1.aspx 4/12/2015.
12° Documenta de Kassel. Disponível in: http://www.documenta.de/en/retrospective/documenta_12 in 13/10/2016
30° Bienal de São Paulo. Disponível em: file:///C: /Downloads/30a_bienal-catalogo-miolo-pt-web%20(1).pdf in 13/10/2016